Barros e o nada a dizer: modo de ficar a brincar – Bordas do inconsciente
Deixei que as palavras me cuidassem
A voz da poesia tem que chegar ao nada para aparecerSó fui reconhecido quando não tinha mais nada para dizer – e fiquei a brincar
O dia em que só faço nada é fecundo
Hoje sei que os verbos deliram – e isso é uma coisa saudável para a poesia
Traduzir poesia é sempre difícil, nós sabemos
Traduzir a minha não será diferente
Penso que o tradutor tem de possuir a infância da língua que vai verter
Será bom ter um adoecimento de criançaNo meu caso adoecer de rios e de rã e de planta e de caramujos
Haver bem a promiscuidade da criança com os seus bichos, com suas aves, como seus brinquedos
Porque o que escrevemos leva sempre pela frente um terreno sujo de nossa infância
E “a infância é o poço do ser”, como diz Bachelard
Queria dizer que possuir a infância da língua seria conhecer bem o poço do poeta a ser traduzido
Saber das misturas da criança que ficam nos sonhos do homem
Manoel de Barros
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