Barros: rascunho, incompletude e a voz inconsciente – Bordas do Inconsciente
Acho que não sou planificado. Pode ser que siga uma voz inconsciente.
Cumpro meus dias de trabalho, de leituras, de anotações, de invenções de versos solteiros – tudo em meus pequenos cadernos de rascunho.
Chega uma hora acho que devo começar a armar os poemas.
Cato os versos nos cadernos e vou fazendo as colagens. Juro que não tenho muita inocência nisso.
Não procuro novos patamares.
Só quero me ser nos poemas. Sou tão endógeno que dá pena.
A gente é rascunho mesmo. Falta acabar. Eu sei.
O que enriquece o artista é a sua incompletude.
Poesia, qualquer arte, é um esforço do artista para chegar perto do divino.
Caminho aos trancos feito aquele mandorová que tem o apelido de midi-parmo. É um ser que vai um palmo e volta outro. E de repente vai um palmo e não volta outro.
Decerto ele desconfia às vezes de algum fulgor e dá pra trás. Eu tenho medo de cometer fulgor em poesia.
Amo a palavra magra sem verniz.
Vou sempre lesmamente apalpando: obscuramente.
Manoel de Barros
Eventos
Muller, A. Manoel de Barros, Rio de Janeiro Beco do Azougue, 2010