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Vera Canhoni

Poesia – Vinicius de Moraes – Ausência

Poesia – Vinicius de Moraes – Ausência 

 

Ausência

 

 

Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar os teus olhos que são doces

Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres eternamente exausto.

 

No entanto a tua presença é qualquer coisa como a luz e a vida

E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz a tua voz.

 

Não te quero ter porque em meu ser tudo estaria terminado

Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados

Para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada

 

Que ficou sobre a minha carne como uma nódoa do passado.

Eu deixarei … tu irás e encostarás a tua face em outra face

Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada

 

Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, porque eu fui o grande íntimo da noite

Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa

 

Porque meus dedos enlaçaram os dedos da  névoa  suspensos  no espaço

E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado.

 

Eu ficarei só como os veleiros nos portos silenciosos

Mas eu te possuirei mais que ninguém porque poderei partir

E todas as lamentações do mar, do vento, do céu, das aves, das estrelas

Serão a tua voz presente, a tua voz ausente, a tua voz serenizada.

 

Vinicius de Moraes

 

MORAES, V. Poesia completa e prosa. Obra completa, Rio de Janeiro: GB, Companhia José Aguilar, 1974.

http://www.veracanhoni.com/psicanalise-atendimentos-clinicos-para-adultos-e-adolescentes-temporariamente-atendimentos-remotos

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