Encontro
Meu pai perdi no tempo e ganho em sonho.
Se a noite me atribui poder de fuga,
sinto logo meu pai e nele ponho o olhar,
lendo-lhe a face, ruga a ruga.
Está morto, que importa? Inda madruga
e seu rosto, nem triste nem risonho,
é o rosto antigo, o mesmo.
E não enxuga suor algum, na calma de meu sonho.
Oh meu pai arquiteto e fazendeiro!
Faz casas de silêncio,
e suas roças de cinza estão maduras,
orvalhadas por um rio que corre o tempo inteiro,
e corre além do tempo, enquanto as nossas
murcham num sopro fontes represadas.
Carlos Drummond de Andrade
DRUMMOND , C.A . Obra completa, Rio de Janeiro: GB, Companhia José Aguilar, 1967
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